Assim que o vi, soube que escondia um passado difícil. Por vezes, quando lidamos com uns e com outros, sejam eles quem forem, desde que tenham sido muitos e, também, desde que estejamos atentos a todos os sinais que nos transmitem - falo, principalmente, dos não audíveis - aprendemos a conhecer melhor todos os que olhamos, com olhos de ver… O seu semblante era pesado, nitidamente. Por detrás daquela franja que lhe encobria um olhar baço, escondia-se, certamente, o medo de se expor. No seu discurso fluía a crença num triste fado, o que eu ouvia, eram, sem dúvida, palavras de alguém que a vida amedrontou. Conversámos. Não muito, é certo, mas, a proximidade das idades, ajudou a quebrar algum desconforto, principalmente, quando por brincadeira, reparei que o boné que trazia, ilustrava um desenho animado que também eu gostava, ou melhor, gostara em tempos. Mas isso, nesse momento, era acessório, o importante de facto, era aproximar-me. A conversa que seguidamente se desenrolou à volta desse assunto, deixou-lhe escapar um sorriso… estava dado o primeiro passo. Em tom baixo, com medo que alguma parede ouvisse, melhor que eu, o que contava, desabafou parte da sua história, razão pela qual, também, me procurara. Ouvi, somente, tentei reter toda a informação, pois optara por abdicar das notas. Achei que tal gesto o intimidaria, e não havia, certamente, necessidade de escrever e eternizar num papel, algo que, de facto, só se queria era esquecer. Marquei nova sessão, dera-lhe alguns dias para que me escrevesse, por sua mão, um texto sobre algo que gostasse. Sugeri o tema do desenho animado que ele mostrara gostar. Adorou a ideia! Despedimo-nos e partiu…
..Nunca pensei em reviver o passado daquela forma. A sua história, o seu rosto inocente denunciavam um sofrimento que me era demasiado familiar. Voltei ao meu quarto escuro, onde sozinho na escuridão do meu recanto enfrentei os demónios que no passado não me deixavam ver o sonho que viria mais tarde a alcançar.. Vivia preso como um animal, sem luz, vivia na penumbra, esse era o meu império, onde me alimentava apenas de esperança e força de vontade de um dia tudo ser diferente..esperando que a luz enchesse de novo a minha alma negra como breu. Senti-me mais uma vez indefeso, frágil, singelo..sem a protecção que agora faziam de mim uma pessoa a temer.. No seu olhar reconheci um esgar de medo, um sentimento tão forte que senti o ar à minha volta sussurrar-me palavras de ajuda, de uma procura incessante por algo que sempre me foi estranho.. Sentimento errante, gélido, desconhecido, rodeava a sua pequena figura..e por mais perto, mais forte, mais poderosa que fosse a minha vontade de o proteger, algo nos separava... Com um andar pesado e apenas a um passo dele aproximei-me e sussurrei: "Voltaste....porquê..?" "Não sou perfeito pai, mas viver um amanhã sem saber o porquê do meu passado nunca irá curar a dor que ainda sinto em mim.." Abracei o meu filho mais uma vez jurando nunca mais o perder novamente para o lado negro da minha alma..
De nada sempre às ordens :) principalmente agora que enquanto ando novamente à procura de emprego tenho mais tempo para dedicar a estes passatempos :) Bj PG
Assim que o vi, soube que escondia um passado difícil. Aproximei-me, lentamente, na expectativa de tentar descobrir algo sobre a sua vida, isto é, o porquê de tanta tristeza. Notava-se no seu rosto enrugado pela melancolia, os olhos quase invisíveis, escondidos por debaixo das pálpebras, como se o mundo fosse medonho e a vontade de o olhar fosse nula. Depois de ter adquirido alguma confiança, falei-lhe do meu passado, dos entes queridos que eu perdera e das lutas que travara para poder superar, e ultrapassar os terríveis obstáculos que me apareceram pela frente, e disse-lhe: _A vida continua, todos nós temos algo de negativo a recordar na nossa vida, mas temos que nos erguer! Após tais palavras, pousando a mão sobre o meu ombro, disse: -Sabe? Eu também passei por algo de terrível e nunca mais recuperei -foram tempos de guerra que passaram, arrasaram a aldeia onde morava e mataram toda a minha família! Arrancaram-me o coração e a alma; foi o fim de uma luz que se apagou, a qual iluminava o meu caminho. Mais algumas palavras e despedimo-nos. Sem olhar para trás, parti, fechei os olhos e as lágrimas correram-me pelo rosto…
Assim que o vi, soube que escondia um passado difícil. Por vezes, quando lidamos com uns e com outros, sejam eles quem forem, desde que tenham sido muitos e, também, desde que estejamos atentos a todos os sinais que nos transmitem - falo, principalmente, dos não audíveis - aprendemos a conhecer melhor todos os que olhamos, com olhos de ver…
ResponderEliminarO seu semblante era pesado, nitidamente. Por detrás daquela franja que lhe encobria um olhar baço, escondia-se, certamente, o medo de se expor. No seu discurso fluía a crença num triste fado, o que eu ouvia, eram, sem dúvida, palavras de alguém que a vida amedrontou. Conversámos. Não muito, é certo, mas, a proximidade das idades, ajudou a quebrar algum desconforto, principalmente, quando por brincadeira, reparei que o boné que trazia, ilustrava um desenho animado que também eu gostava, ou melhor, gostara em tempos. Mas isso, nesse momento, era acessório, o importante de facto, era aproximar-me. A conversa que seguidamente se desenrolou à volta desse assunto, deixou-lhe escapar um sorriso… estava dado o primeiro passo.
Em tom baixo, com medo que alguma parede ouvisse, melhor que eu, o que contava, desabafou parte da sua história, razão pela qual, também, me procurara.
Ouvi, somente, tentei reter toda a informação, pois optara por abdicar das notas. Achei que tal gesto o intimidaria, e não havia, certamente, necessidade de escrever e eternizar num papel, algo que, de facto, só se queria era esquecer.
Marquei nova sessão, dera-lhe alguns dias para que me escrevesse, por sua mão, um texto sobre algo que gostasse. Sugeri o tema do desenho animado que ele mostrara gostar. Adorou a ideia!
Despedimo-nos e partiu…
..Nunca pensei em reviver o passado daquela forma. A sua história, o seu rosto inocente denunciavam um sofrimento que me era demasiado familiar. Voltei ao meu quarto escuro, onde sozinho na escuridão do meu recanto enfrentei os demónios que no passado não me deixavam ver o sonho que viria mais tarde a alcançar..
ResponderEliminarVivia preso como um animal, sem luz, vivia na penumbra, esse era o meu império, onde me alimentava apenas de esperança e força de vontade de um dia tudo ser diferente..esperando que a luz enchesse de novo a minha alma negra como breu.
Senti-me mais uma vez indefeso, frágil, singelo..sem a protecção que agora faziam de mim uma pessoa a temer..
No seu olhar reconheci um esgar de medo, um sentimento tão forte que senti o ar à minha volta sussurrar-me palavras de ajuda, de uma procura incessante por algo que sempre me foi estranho..
Sentimento errante, gélido, desconhecido, rodeava a sua pequena figura..e por mais perto, mais forte, mais poderosa que fosse a minha vontade de o proteger, algo nos separava...
Com um andar pesado e apenas a um passo dele aproximei-me e sussurrei:
"Voltaste....porquê..?"
"Não sou perfeito pai, mas viver um amanhã sem saber o porquê do meu passado nunca irá curar a dor que ainda sinto em mim.."
Abracei o meu filho mais uma vez jurando nunca mais o perder novamente para o lado negro da minha alma..
Aproveito para deixar o meu espaço:
ResponderEliminarhttp://scorpions-corner.blogspot.com/
Obrigada Amigo!
ResponderEliminarDe nada sempre às ordens :) principalmente agora que enquanto ando novamente à procura de emprego tenho mais tempo para dedicar a estes passatempos :) Bj PG
ResponderEliminarAssim que o vi, soube que escondia um passado difícil.
ResponderEliminarAproximei-me, lentamente, na expectativa de tentar descobrir algo sobre a sua vida, isto é, o porquê de tanta tristeza. Notava-se no seu rosto enrugado pela melancolia, os olhos quase invisíveis, escondidos por debaixo das pálpebras, como se o mundo fosse medonho e a vontade de o olhar fosse nula. Depois de ter adquirido alguma confiança, falei-lhe do meu passado, dos entes queridos que eu perdera e das lutas que travara para poder superar, e ultrapassar os terríveis obstáculos que me apareceram pela frente, e disse-lhe:
_A vida continua, todos nós temos algo de negativo a recordar na nossa vida, mas temos que nos erguer! Após tais palavras, pousando a mão sobre o meu ombro, disse:
-Sabe? Eu também passei por algo de terrível e nunca mais recuperei -foram tempos de guerra que passaram, arrasaram a aldeia onde morava e mataram toda a minha família! Arrancaram-me o coração e a alma; foi o fim de uma luz que se apagou, a qual iluminava o meu caminho. Mais algumas palavras e despedimo-nos. Sem olhar para trás, parti, fechei os olhos e as lágrimas correram-me pelo rosto…
Renascer
ResponderEliminarVim ao mundo p’ra viver,
E fui vítima da sorte,
Passo tempos a sofrer,
Mas lutarei contra a morte.
Olhei para trás e vi,
Outros e o sofrimento,
Sem dar conta renasci,
Sentindo um novo alento.
Ganhei forças e coragem,
E preparei a viagem,
Da vida para viver,
Luto p’la paz e amor,
Assim se preciso for,
Lutarei p’ra renascer.
Fernando Figueiredo